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domingo, 1 de dezembro de 2013

LEMBREMOS TEIXEIRA DE PASCOAES

O POETA DA SAUDADE.


Se nos quisermos ater, precisamente, no sentido e significado, que, em Teixeira de Pascoaes, a palavra saudade adquire, sempre diremos que saudade não é mera evocação do passado, nem uma rememoração. É puro acto criador.
Se considerarmos as próprias palavras do poeta – “a minha alma aspira e aspirou sempre à divindade” – poderíamos mesmo dizer que, em Pascoaes, saudade é a aproximação do divino.
É claro que há aquela saudade vulgar, quotidiana, que todos experimentamos e que leva, as mais das vezes, à inércia, a melancolia e ao abandono. Saudade em Pascoaes é acto de criação.
Assim a saudade é metafísica. É um processo ontológico, que ultrapassa o estádio vulgar da existência e atinge aquele outro estádio, intemporal, místico, onde a vida é só vida e nada mais.
É a forma que o poeta encontrou, por assim dizer, de ultrapassar o plano físico e vulgar. Situa-se num plano metafísico, transcendental, onde o sonho e a realidade se fundem.
Nessa atmosfera, nesse limbo de sonho e realidade, Teixeira de Pascoaes vai criar, então, as mais belas páginas da nossa literatura poética.
Teixeira de Pascoais nasceu em Amarante, a 2 de Novembro de 1877.
Ali passa a sua meninice, faz a escola primária e entra no liceu.
Muito mau aluno, reprovado a Português, muda-se em 1895, com dezoito anos, para Coimbra. Ali completa o liceu e entra na Universidade em 1896.
Forma-se em Direito e abre escritório de advocacia na rua das Taipas, no Porto.
Mas advocacia e poesia são consonância que em Pascoaes não jogam muito bem.
Amarante, o Tâmega, o Marão chamam por ele: é ali que ele pertence.
Fecha o escritório, esquece que é advogado e … vai radicar-se, definitivamente, no solar paterno de Pascoaes.
Ali, em comunhão íntima com aquela paisagem amarantina de onde, verdadeiramente, tirou a seiva que corre na sua poesia, vai escrever uma obra ímpar, toda de igual e grande importância, que só tem o seu epílogo quando, naquela manhã, fria e chuvosa, de 14 de Dezembro de 1952, domingo, Teixeira de Pascoaes dá o último suspiro.


A canção de uma sombra
Ah, se não fosse a névoa da manhã
E a velhinha janela, onde me vou
Debruçar, para ouvir a voz das coisas,
Eu não era o que sou.
Se não fosse esta fonte, que chorava,
E como nós cantava e que secou…
E este sol, que eu comungo de joelhos,
Eu não era o que sou.
Ah, se não fosse este luar, que chama
Os espectros à vida, e se infiltrou,
Como fluido mágico, em meu ser,
Eu não era o que sou.
E se a estrela da tarde não brilhasse;
E se não fosse o vento, que embalou
Meu coração e as nuvens, nos meus braços,
Eu não era o que sou.
Ah, se não fosse a noite misteriosa
Que meus olhos de sombras povoou,
E de vozes sombrias meus ouvidos,
Eu não era o que sou.
Sem esta terra funda e fundo rio,
Que ergue as asas e sobe, em claro voo;
Sem estes ermos montes e arvoredos,
Eu não era o que sou.
Teixeira de Pascoaes

Um texto de José Silva

Novelas 1 de Dezembro de 2013


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